quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013
OS VINICIUS DE MORAES
Por
Stanislaw Ponte Preta
Eu confesso a vocês que
descobri o segredo do coleguinha jornalista, poeta, diplomata e teleco-tequista
Vinicius de Moraes numa tarde em que ambos (não ambos os Vinicius, como ficará
provado mais tarde, mas ambos: eu e ele) tomávamos umas e outras no Bar
Calypso, num desses crepúsculos vespertinos de Ipanema que já baixam pedindo um
chope.
Estávamos lá “entornando”,
quando chegou minha hora de subir para Petrópolis:- Poetinha, eu vou me mandar
– disse eu. Ele suspirou, ante a perspectiva de ter de ficar sozinho e desejou
boa viagem. Eu entrei no carro e subi para Petrópolis, onde cheguei certo de
que nenhum carro passara pelo meu na estrada. No entanto, parei na Avenida 15
da cidade serrana, manobrei o carro e coloquei na vaga indo tomar mais um na
Confeitaria Copacabana. Quando entrei e olhei para as mesas, vi que um camarada
me saudava lá de dentro: era Vinicius de Moraes. Foi nessa tarde - repito – que
eu descobri que Vinicius era, pelo menos dois. Está claro que pode haver mais
de dois. Duvido até que as múltiplas atividades de Vinicius (reparem que seu
nome já é no plural para enganar os trouxas) possam ser realizadas só por dois
deles. Acredito mesmo que haja uma meia dúzia de Vinicius: um para poesia, um
para diplomacia, outro para samba, um quarto para jornalista e o resto para
mulher. Desses, os mais assoberbados talvez sejam os últimos. Eu acho,
outrossim, que sou o único ao qual Vinicius (não sei qual deles) deu a pala de
que eles são uma equipe e não um homem, por isso fico rindo dos coleguinhas que
disputam o privilégio de noticiar o Vinicius certo na hora exata. Os jornais de
ontem, por exemplo, estavam muito pitorescos sobre Vinicius (todos os
Vinicius). Em Última Hora a confreirinha jornalista Teresa Cesário Alvim, num
esforço de reportagem, dizia: “Vinicius de Moraes anda a todo vapor, de uns
tempos para cá. Tomou pressão em Petrópolis e desceu a serra carregado de ideias,
jorrando inspiração para todos os lados.” (Coitada da Teresa, não sabe que há
Vinicius pela aí tudo.) Já o coleguinha Jacinto de Thormes, no mesmo dia, na
mesma UH e talvez escrevendo à mesma hora, dizia: “O Senhor Vinicius de Moraes
está fazendo uma temporada de repouso na Clínica São Vicente.” De fato, há um
dos Vinicius que está repousando, o que explica as notícias tão desencontradas
de dois colunistas, no mesmo jornal, no mesmo dia. No mesmo dia, aliás, o
Carlos Alberto escrevia na sua coluna: “O poeta Vinicius de Moraes, ontem de
madrugada, conversando no Restaurante Fiorentina.” É verdade. Vinicius estava
lá no Fiorentina, numa roda batendo papo. Dezenas de testemunhas podem provar o
que o Carlos Alberto disse. Estava também tomando oxigênio, na Clínica São
Vicente, estava em casa com amigos, compondo sambas ao som do violão de Baden
Powell, estava no Cine Alvorada, assistindo a “Morangos Silvestres” (o porteiro
me disse que o Vinicius já assistiu à fita quatro vezes, mas é mentira. Vários
Vinicius ainda não viram). Como, minha senhora? A senhora não acredita que
Vinicius seja uma porção? Azar o seu, dona. Um dia ainda se fará um programa de
televisão com Vinicius ao violão, acompanhando outro Vinicius que canta, junto
com um quarteto vocal de Vinicius. Sem vídeo-tape. Quem tem razão é Tia
Zulmira, quando diz que, se Vinicius de Moraes fosse um só, não seria Vinicius
de Moraes, seria Vinício de Moral.
1.Texto originalmente
publicado na 4ª edição do livro “Rosamundo e os outros”, de Stanislaw Ponte
Preta, editado pela Civilização Brasileira (1975).
2.Stanislaw Ponte Preta é um
fantástico personagem criado pelo jornalista carioca Sérgio Porto [1923 –
1968]. “Rosamundo e os outros”, é o terceiro título de uma série que ainda
inclui “Tia Zulmira” e “eu e Primo Altamirando e elas”.-(Poética e Cotidiana)
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